PROJETO POTÊNCIA

Não será possível sobreviver sem contar nossa própria história desde outro mundo

A exposição tensiona as expectativas de quem somos e como devemos existir. Ser trans, projeto de Gabz 404 que dá origem à exposição, rompe com a ideia de que corpos trans precisam se encaixar em dualidades — ora violentados, ora exaltados, ora ativistas, ora invisíveis.

O projeto se debruça sobre as contradições, partindo da premissa de que, discutir identidade também é discutí-la como forma de des-identidade. Dispostas como constelações, as imagens desestabilizam olhares normativos, não para afirmar um lugar de pertencimento, mas para abrir brechas nos discursos que insistem em categorizar o que é possível viver, sentir e imaginar. Em vez de repetir narrativas de marginalização, a exposição sugere outras formas de presença, focadas nas nuances que permeiam a vida de quem insiste em existir fora de uma cisheteronorma capitalista.

A seleção sugere um espaço onde corpos dissidentes sonham desde outros mundos possíveis traduzida na mostra de 34 obras reunindo fotografias, impressão jato de tinta em papel offset, dispostas nas paredes com ímãs..

artista

Artista visual, fotógrafo, pesquisador e astrólogo. Seu trabalho explora as funções políticas e epistemológicas das imagens para especular sobre novas formas de ser (mais que) humano, investigando como as dissidências de gênero desafiam o status quo. Seus projetos abordam temas como identidade, memória, ecologia, inteligência artificial e o cosmos. Criou em 2020 o projeto ser trans, um arquivo de memórias visuais, sonoras e textuais de pessoas trans vivas. Em 2022, ele co-dirigiu e produziu o documentário Intransitivo. Outras pesquisas em andamento incluem Insurgência de Aquário e 2384, que exploram como a inteligência artificial armazena dados do inconsciente coletivo e as implicações dessas tecnologias. Em 2024, foi indicado ao Prêmio Pipa e residente no Pivô em São Paulo. Teve seu trabalho exposto em diversas instituições, incluindo The Royal Photographic Society (Reino Unido), Bienal de Bochum (Alemanha), Instituto Moreira Salles (São Paulo, Brasil) e Museu Casa das Onze Janelas, através do Prêmio Diário Contemporâneo de Fotografia (Belém, Brazil).

texto curatorial

Não será possível sobreviver sem contar nossa própria história desde outro mundo

Em que mundo estamos vivendo? Em que mundo queremos viver? Que visões de mundo são possíveis? De que modo eu enxergo, e de que modo você enxerga o entorno? Eu, infelizmente, vivo constantemente na condição de afirmar e reafirmar minha vivência, existência e sobrevivência na maior parte do tempo.
Não! Não vou falar disso novamente. Já cansei!
Não quero falar das rotinas para minha aplicação no SUS, nem de como meu corpo se TRANSforma. Também não quero falar de identidade e representatividade, até porque só posso representar a mim mesme. Muito menos quero falar de violência. Vocês já não se cansaram disso?
Quero falar de cotidiano, de paixão, amor, felicidade, tristeza, frustração, trabalho, festa, faculdade, e tudo aquilo que parece ser colocado em pauta quando não estamos inserides. O que o público espera ao entrar em uma exposição onde corpos como os nossos são os proponentes e as próprias obras de arte?
Também quero falar como não aguento mais a destruição do lugar onde moramos.
O cisheterocaptali$mo está intoxicando a vida que tem no mundo, e ninguém consegue fugir, seja humano, animal, vegetal ou qualquer coisa viva que não se encaixa nesses três.
Sim! Essa exposição mostra pessoas trans, e também é feita por nós mesmes. Mas se você já sabe disso, porque a expectativa em ler mais um texto de parede que explique sobre como nossas vivências são marginalizadas, e toda aquela ladainha de sempre?
Essa exposição é sobre outros modos de ver, sentir e presenciar o cotidiano, a vida e o nosso entorno. É sobre sonhos bregas, simples e comuns. Sobre empatia, amizade e criação conjunta. Gabz 404 não realiza apenas retratos de pessoas trans, mas proporciona uma construção conjunta das imagens que serão apresentadas ao público. Como já escrito por Paul B. Preciado: “Não será possível sobreviver sem contar nossa própria história de outro modo. Sem sonhar de outro modo.”
Sue Gonçalves Historiadore da Arte,
crítico de arte e mestrande em Artes Visuais na UFRGS

abertura
25 de outubro de 2024, 19 horas
Conversa com artistas às 17h

visitação
até 24 de novembro 2024
de terça a domingo, das 10h às 18h, inclusive feriados

entrada franca